Há um tempo, me pediram para falar sobre a reconciliação. Na hora de montar os slides, foi difícil pensar em quais imagens usar. Se bem seja a reconciliação uma realidade muito concreta, às vezes fica difícil representá-la através de imagens.
Fiquei surpreso ao ver fluir a escolha na hora de montar o slide sobre os quatro níveis de ruptura e de reconciliação (tópico clássico ao falar do tema): com Deus, consigo mesmo, com os irmãos, com a Criação. Escolhi a imagem de Francisco de Assis. Não demorei em encontrá-lo abraçando a Cruz, a alguém que sofre ou de braços abertos perante a Criação toda.
Pois bem. É a imagem deste santo que vem de novo à tona com a nova encíclica do Papa, assinada na Basílica de Assis, tendo como título Fratelli tutti (irmãos todos), frase tomada de São Francisco (Admoestações, 6, 1: FF 155). Eis o que o Pobrezinho de Assis traz com força para o nosso olhar: a contemplação amorosa que leva a estabelecer relações novas com tudo e com todos.
Já o Papa o expressou de forma belíssima numa encíclica que também toma emprestadas palavras deste Santo no título (Laudato Si’, 10):
“Manifestou uma atenção particular pela criação de Deus e pelos mais pobres e abandonados. Amava e era amado pela sua alegria, a sua dedicação generosa, o seu coração universal. Era um místico e um peregrino que vivia com simplicidade e numa maravilhosa harmonia com Deus, com os outros, com a natureza e consigo mesmo. Nele se nota até que ponto são inseparáveis a preocupação pela natureza, a justiça para com os pobres, o empenho na sociedade e a paz interior”.
O testemunho de São Francisco é um apelo a nos relacionarmos de forma nova com o Criador e suas obras. Aliás, a reconhecer, em cada uma das suas criaturas, irmãos e irmãs se relacionando conosco. E não se trata de um chamamento abstrato, sem rosto nem forma. É um chamamento à fraternidade, ao encontro.
Isto ficou dramaticamente expresso pelo Papa no Momento Extraordinário de Oração em Tempo de Pandemia, no dia 27 de março de 2020, numa Praça de São Pedro vazia:
“Com a tempestade, caiu a maquiagem dos estereótipos com que mascaramos o nosso ‘eu’, sempre preocupado com a própria imagem; e ficou a descoberto, uma vez mais, aquela (abençoada) pertença comum a que não nos podemos subtrair: a pertença como irmãos”.